terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Um dia, os homens da terra decidiram emoldurar o mundo. Chegaram à conclusão de que uma obra de arte tão linda – embora viva- deveria ter um adorno apropriado. Muitos (do povo, é claro) foram contra, mas sempre houve rebeldes no mundo, então quem ligava? Estava decidido: O mundo ganharia uma bela moldura.

- Devemos fazer uma moldura de flores! – Certo ministro disse.

- Elas murchariam e precisariam de reparo constante.

- Que tal de bronze?

- Com o tempo escureceria e precisaríamos de polidores tão grandes quanto tanques de guerra.

O debate foi de tornando fervoroso, líderes do mundo todo tentando escolher o material do qual seria feita a grande moldura. Dias se passaram até a conclusão:

- Faremos de madeira, como nas grandes pinturas. Será polida e lustrosa, dos mais variados tipos. Ficará em um lugar tão alto que cupim algum a alcançará.

E então todos se mobilizaram. Em cada país, todo tipo de madeira foi recolhida, de todos os tipos, cores e texturas. Cada um competindo, em silêncio, para ver quem conseguia mais toras de madeira para a grande construção. Meses se passaram até a grande inauguração. Enfim, estava pronta. O mundo parou para contemplar o grande feito. Silêncio. O peito cheio de orgulho dos governantes, cada um pensando que era mais importante que o outro. Até que um senhor, já de bastante idade, interrompeu o silêncio e disse:

- Vocês quiseram emoldurar uma grande obra de arte viva. Mas vejam só, o que fizeram. Destruíram todas as árvores do mundo, e o que sobrou? Uma arte extinta, uma obra de natureza morta, sem cor ou luz. A vida por aqui acabou. O sol não bate aqui como antes, tudo o que sobrou foram essas verdes folhas que agora se sustentam caídas, sobre o chão, sem os galhos que as fortaleciam antes. Em breve, estarão marrons e sem vida ou cor, assim como todo o resto. Vejam o que fizeram, vejam! – e o pobre ancião pôs-se a chorar. O resto do povo começou a gritar e a se rebelar, concordando com o velho. Um dos grandes políticos, sem reação diante de tal polêmica, disse:

- Pois – respirou fundo – vejo que muitos de vocês não gostaram de nossa grande obra. Mas vejam só, a arte, agora, são vocês, meu povo! Sintam-se lisonjeados!

- Não somos o seu povo, somos o povo do mundo. Mundo agora que morreu e está povoado de tristeza, então como viveremos? Vocês não são donos do mundo.

Num gesto de rebelião, as pessoas da Terra foram em direção aos grandes pássaros, que, sem mais onde pousar, estavam cansados. Mas o povo, indignado, a fim de dar um fim desse absurdo, montaram nos pássaros, os grandes pássaros, e voaram até o ponto mais alto, onde podiam alcançar a gigante moldura. Lá de baixo, os governantes estavam atônitos. Sem saber o que fazer, ficaram parados, olhando para o céu. Uma chuva torrencial de pregos começou a cair. E antes que pudessem correr, ou quem sabe se arrepender, o pesado céu de madeira caiu sobre eles. O mundo agora estava forrado pela grande obra dos falsos grandes homens. O sol pôde bater novamente pelas faces da terra e a vida recomeçou. Mais uma vez.